Existem várias normas
aplicadas aos acidentes de trabalho e às doenças ocupacionais, especialmente no
que se refere às indenizações cabíveis e à comunicação dos infortúnios, para zelar da segurança do trabalhador, tendo em vista as injustiças históricas que aconteceram face a falta de legislações protetivas. O Direito do Trabalho foi criado para evitar tratamentos desumanos no
ambiente de trabalho. No entanto não se tem conseguido evitar as doenças,
lesões e mortes, sendo necessário analisar caminhos que possibilitem uma maior eficácia dessas normas, com a consequente diminuição dos danos aos empregados.
1. INTRODUÇÃO
Durante
muitos anos, em que não existiam as Legislações trabalhistas, os empregados trabalhavam
em condições precárias e se submetiam a salários baixíssimos para garantir seu
sustento.
Também
não havia jornada de trabalha determinada, o que os obrigava a trabalhar muito
além de suas condições físicas e mentais diárias.
Ademais,
os locais de trabalham eram inapropriados, muitos tinham pouca circulação de
ar, o que causava problemas de saúde, especialmente, respiratórios.
Também
não eram usados equipamentos de segurança adequados para evitarem acidentes
como: mutilações, queimaduras, entre outros vários. Isso, junto à falta de
descanso necessário dos funcionários causava um alto índice de acidentes com
lesões e até mortes.
Os
acidentes de trabalho também atingiam crianças, que muitas vezes eram obrigadas
a trabalhar para complementar as baixas remunerações recebidas por seus pais.
Elas eram as mais prejudicadas, pois tinham afetados o seu desenvolvimento
físico e mental.
O
que se sabe é que desde o início dos tempos o homem trabalha e depende disso
para seu sustento, de modo que qualquer ocorrência que cause prejuízo em sua
saúde pode acarretar sérias consequências em sua condição econômica e
manutenção sua e de sua família.
O
Desembargador do Tribunal Regional da 3ª Região, Sebastião Geraldo Oliveira, em
poucas palavras, consegue explicar essa situação:
O acidente mais grave interrompe
abruptamente a trajetória profissional, transforma sonhos em pesadelos e lança
uma nuvem de sofrimentos sobre as vítimas indefesas, cujos lamentos ecoarão
distante dos ouvidos daqueles empresários displicentes que atuam com a vida e a
saúde dos trabalhadores como simples ferramentas produtivas utilizadas em sua
atividade.
Para garantir a integridade física dos
trabalhadores e evitar a impunidade e a falta de reparação de danos sofridos foi
necessária a criação de normas protetivas contra os descasos e abusos que o
empregador cometia, em virtude da mais-valia.
Dentre
as principais garantias do empregado vislumbra-se a imposição de medidas
preventivas que impõem ao empregador o uso de instrumentos de proteção
obrigatórios, a fiscalização, melhores ambientes de trabalho, entre outros.
A
Legislação traz ainda medidas de diminuição de danos do trabalhador caso ele
seja acometido por doenças ocupacionais ou sofra acidente de trabalho. Dentre
as principais estão: a possibilidade de pensionamento pelo INSS durante o
período de afastamento, a estabilidade provisória no emprego, as indenizações
patronais de reparação de danos, entre outras.
Porém,
em que pese a criação de várias leis protetivas e da fiscalização imposta, os
índices de acidentes de trabalho que ocorrem no Brasil ainda são muito altos, e
os demais países do mundo não estão fora deles.
De
acordo com as Organizações Internacionais do Trabalho (OIT), ocorrem por volta
de 337 milhões de acidentes por ano no mundo, que representa uma média
aproximada de 923 mil por dia ou mais de dez por segundo. Desse elevado número
de ocorrências, resultam a cada ano por volta de 2,3 milhões de acidente de
trabalho com óbito ou mais de quatro mortes por minuto.
A
obra Sebastião Geraldo de Oliveira traz dados importantes acerca dos índice de
acidentes que ocorrem no Brasil:
Os números dos acidentes de trabalho
deixam à mostra a marca dolorosa do problema, mormemente na construção civil,
na indústria e no setor de serviços. Basta dizer, com base na estatística de
2011, que ainda ocorrem no Brasil por volta de oiti mortes a cada dia por
acidente do trabalho. Se somarmos o número de mortes por acidente de trabalho
(2.938) com a quantidade daqueles que se aposentam por incapacidade permanente
(16.658), concluírem que diariamente mais de 53 pessoas deixam definitivamente
o mundo do trabalho. Além disso, em média, 840 trabalhadores por dia entram em
gozo de auxílio-doença acidentário com afastamento superior a 15 dias.
Logo, pode-se concluir que,
apesar de eficientes, as normas não tem sido eficazes. Diante disso, os
estudiosos e operadores do Direito trazem à baila frequentes debates em busca
de implementar as alterações necessárias para o efetivo cumprimento da
Legislação acidentária.
2. SURGIMENTO DAS NORMAS
PROTETIVAS
2. 1. Breve relato sobre a
história do trabalho humano
A
origem e a história do Direito do Trabalho é muito antiga, podendo-se afirmar
que o trabalho é inerente ao ser humano. Ela foi dividida em diferentes fases
que acompanharam as mudanças sociais.
Na
primeira fase, também conhecida como Fase Arqueológica, que marcou o início das
eras, o trabalho era desenvolvido de forma primitiva, com a utilização de
instrumentos rudimentares, visando atender às necessidades imediatas, sem
reservas ou acúmulos.
O
Trabalho se caracterizava por uma cooperação simples. A mulher era encarregada
da alimentação vegetal (plantio e colheita), enquanto aos homens incumbia a
caça e a pesca. Era a divisão do trabalho por sexo.
Num
segundo momento, surgiu a Fase da Escravidão, que teve como origem as guerras,
por meio das quais os perdedores eram mortos ou então passavam a sujeitar-se
aos vencedores, servindo-lhes como escravos, eram tratados como “res” (coisa)
sem qualquer possibilidade de, um dia, vir a se tornarem sujeitos de direito.
O escravo
era visto como coisa e não pessoa, do qual era exigido um trabalho produtivo,
vale dizer, destinado à geração de bens e serviços economicamente utilizáveis
àquele que possuía seu domínio.
Aristóteles
justificava o trabalho escravo afirmando que, para conseguir cultura, era
necessário ser rico e ocioso e que isso não era possível sem a escravidão. O
filósofo ainda que a escravidão somente desapareceria quando a lançadeira do
tear se movimentasse sozinha.
A
escravatura se manifestou no Brasil desde o descobrimento pelos portugueses,
que introduziram o trabalho forçado dos índios e dos negros africanos, sendo
que assim, passou a se estruturar o sistema produtivo e integrar o Brasil na
economia mundial.
O
sistema escravista foi sendo substituído pelo Servilismo, que predominou
durante o período da Idade Média, em que se vislumbrava a figura dos servos e
dos senhores feudais.
Como
o próprio nome já diz: os servos (não-livres) eram aqueles que serviam aos
senhores das terras em que viviam. Embora eles recebessem proteção dos senhores
feudais, eram obrigados a trabalhar em suas terras, sendo que tudo que produziam
era pago em troca de segurança e da utilização das terras, sendo que eram,
inclusive, obrigados a pagar diversos impostos, como, por exemplo, na herança,
no casamento, etc.
Assim,
pode-se dizer que advento de período da servidão não significa que a escravatura
tenha sido abolida. O homem continuou sendo tratado como animal do homem, os tipos
de graus de opressão é que são variáveis, no tempo e no espaço.
O
servo também estava preso ao senhor feudal, não possuindo liberdade de
deslocamento, e sendo muitas vezes obrigados a participarem de guerras ou sendo
cedidos para trabalhar em outras terras ou em pequenas indústrias.
A
Servidão foi um tipo generalizado de trabalho em que o indivíduo, sem ter a condição
jurídica de escravo, na realidade não dispunha de sua liberdade. Era um
semilivre, não tendo o direito de abandonar a terra. Diferia do escravo porque
tinha personalidade jurídica completa e, logo, podia contrair casamento, ter
filho sob o pátrio poder, ser proprietário, tornar-se credor e devedor.
Com
o passar dos tempos surgiram as cidades (burgos), intensificou-se o comércio e
a produção de bens e ocorreu o crescimento e fortalecimento da burguesia, que
eram os comerciantes. Assim, começou a queda do sistema feudal e os servos
passaram a ser livres trabalhadores.
Para
a produção, formaram-se grupos unidos em decorrência da identidade de
profissões, as quais passaram a ser chamadas de corporações. Surgiram três
tipos de trabalhadores: Mestres, Companheiros ou Oficiais, Aprendizes, sendo
que os dois primeiros tipos eram equiparados a empregadores e empregados
respectivamente.
O
mestre era a figura central das corporações, as quais estavam inteiramente
submetidas no seu julgo disciplinar, inclusive quanto ao direito dos aprendizes
mudarem de domicílio. Em paga dessa submissão, recebiam salário e amparo em
situações de enfermidade, além de lhes ficar garantido um verdadeiro monopólio
de profissão, pois só podiam exercê-la os que tivessem inscritos na Corporação
respectiva.
Por
fim, abria também a perspectiva de, um dia, se tornaram mestres, ou seja,
surgia a possibilidade da mobilidade social que não existia no feudalismo.
A
partir do século XIX, as produções, que eram feitas com a força humana e instrumentos
rudimentares, passou a contar com o fenômeno de mecanização em importantes
setores de países europeus, principalmente a Inglaterra, como a extração de
carvão mineral, metalurgia, fiação, cultivo agrícola, construção naval e
ferroviária. Acontecia a Revolução Industrial.
O
surgimento da máquina acabou com o trabalho artesanal e fomentou a produção em
massa e o consequente aumento nos lucros dos donos da produção, no entanto,
desencadeou uma profunda reviravolta na textura social.
Com
o advento da tecnologia, a mão-de-obra humana foi substituída pelas máquinas e
muitos trabalhadores foram dispensados trazendo o desemprego.
Com
a redução dos postos de trabalho e o grande número de pessoas em busca de
preenchê-los, homens, mulheres e até crianças passaram a trabalhar sob
condições desumanas até a exaustão para serem mais competitivos e garantirem
seus empregos.
Esse
movimento favoreceu os interesses dos donos das corporações, que visavam a
obtenção da máxima lucratividade. O que era feito com a diminuição de
gastos/custos da mãe de obra disponível, que não tinha valor mínimo legalmente
regulamentado. Em outras palavras, passou a haver uma forte exploração dos
patrões sobre seus funcionários em busca do aumento dos lucros.
As
remunerações oferecidas no mercado de trabalho eram muito baixas,
principalmente quando se tratava de trabalhos femininos e infantis, que eram
considerados mais fracos. Além do que as jornadas de trabalho impostas eram muito
longas, para que os empregadores obtivesse o máximo de aproveitamento do valor
gasto com a mão de obra.
A
consequência das longas jornadas e da falta de investimentos em segurança - que
nem mesmo era levado em conta pelas empresas - era um altíssimo índice de
doenças e acidentes de trabalho, que causavam sequelas e até a morte dos
funcionários.
Na
busca de estarem inseridos no mercado de trabalho e de receberem alguma quantia
que garantisse seu sustento, os operários se submetiam às péssimas condições de
trabalho, hoje consideradas desumanas.
Tal tratamento
desumano, ou seja, que desconsiderava a condição de homem, à época, não era de
se estranhar, já que ele sempre fora empregado pelos poderosos aos menos
favorecidos, conforme vislumbrado nos momentos históricos anteriores.
Foi
com a preocupação de regulamentar esses abusos à classe operária, que representava
a maioria das pessoas, que se deu início ao Direito do Trabalho. A partir de
então, os operários passaram, inclusive, a organizar os chamados sindicatos.
2. 2. Constitucionalismo
Social
No
início do século XX surgiu o movimento de inclusão das leis trabalhistas nas
Constituições de alguns Países, denominado Constitucionalismo Social.
O
México foi primeiro país que tratou em sua Constituição sobre o direito do
trabalho em 1917, sendo que regulamentou a jornada diária de 8 horas, a jornada
máxima noturna de 7 horas, a proibição do trabalho de menores de 12 anos, a
limitação da jornada do menor de 16 anos a 6 horas, o descanso semanal, a
proteção à maternidade, o direito ao salário mínimo, igualdade salarial,
proteção contra acidentes de trabalho, direito de sindicalização, de greve, de
conciliação e arbitragem dos conflitos, de indenização de dispensa e seguros
sociais.
A
Constituição da Alemanha foi a segunda Carta a fazer referência ao direito do
trabalho em 1919, que repercutiu em toda Europa e, dentre outros direitos,
disciplinou a participação dos trabalhadores nas empresas.
Legislação
muito importante foi a Carta del Lavoro
da Itália, de 1927, que serviu como base dos sistemas políticos corporativistas,
não só desse país, mas também da Espanha, Portugal e Brasil, tendo como
princípio a intervenção do Estado na ordem econômica, o controle do direito
coletivo do trabalho e, em contrapartida, a concessão, por lei, de direitos aos
trabalhadores.
No
Brasil, a grande inserção dos direitos dos trabalhadores na Constituição
Federal ocorreu com a promulgação da Constituição de 1988, especialmente, no
capítulo dos Direitos Sociais e do Trabalhador.
Entre os principais direitos
está o da permanência no trabalho. A legislação constitucional buscou a
proibição das despedidas arbitrárias, gerando assim a garantia de emprego ao
trabalhador, o qual deixou de ser peça tão facilmente substituída pelo
empregador. Tema que será aprofundado no próximo capítulo.
No que tange as legislações
trabalhistas brasileiras acerca da infortunística do trabalho, desde o início
do século XX, diversos projetos buscaram instituir uma lei específica para
regulamentá-lo, sendo que a primeira lei acidentária brasileira foi o Decreto
Legislativo número 3.724, de 15 de Janeiro de 1.919, que institui a
responsabilidade pelo pagamento das indenizações em virtude dos acidentes.
Em 1.988, a Constituição
Federal trouxe em seu artigo 7º (Capítulo II: Dos Direitos Sociais) os
principais direitos fundamentais dos trabalhadores. Podendo-se elencar, entre
os principais que resguardam a integridade física e a mental do trabalhador:
- a proibição de dispensas
arbitrárias, com previsão de indenização caso ocorram;
- a jornada de trabalho não
superior a 8 horas dias e 44 semanais;
- o descanso semana
remunerado;
- as férias anuais;
- a remuneração do salário
noturno superior ao diurno;
- o seguro contra acidente
de trabalho, sem excluir a indenização devida.
É possível verificar que o
constituinte deu grande importância aos intervalos de trabalho e descanso do
empregado, isso porque o excesso de trabalho diário, semanal ou mesmo anual,
pode gerar cansaço e estafa do empregado, que é fator predominante para ocorrência
de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.
Essa
proteção foi estendida aos casos de acidentes de trabalho, assim o trabalhador
passou a ter garantido seu cargo face à sua incapacidade ou debilidade
ocasionada por acidentes ou doenças ocupacionais sofridos na execução de suas
atividades.
Também,
como forma de evitar dispensas indevidas e danos no caso em que ocorram após
acidentes ou o diagnóstico de doenças, o constituinte previu a garantia contra
dispensas arbitrárias.
A estabilidade provisória do
empregador nos casos de acidente de trabalho ou doenças a ele equiparadas foi
expressa na Lei de número 8.213/9 - que foi promulgada no bojo do Plano de
Benefícios de Previdência Social e após os vários Decretos que trataram sobre
os acidentes de trabalho desde de 1.919 - é a que hoje vigora sobre o tema.
Assim, dispõe em seu artigo
118:
Art.
118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo
mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após
a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de
auxílio-acidente.
Em
outras palavras, o legislador estabeleceu a manutenção obrigatória do
trabalhador no emprego por, no mínimo um ano, no caso de problemas de saúde.
Isso
porque ele vislumbrou que no caso de dispensa do trabalhador debilitado, este
não tinha chances de conseguir colocação imediata em outra empresa, a qual
preferiria contratar outros com maiores condições de saúde.
E o
empregado que se tornava incapacitado era imediatamente descartado, como se
fosse um objeto que havia perdido sua utilidade. O que ainda era forte
característica da desumanização no ambiente de trabalho.
Assim,
a medida representou um enorme avanço dos direitos dos trabalhadores, pois deu
ao trabalhador tratamento humanitário, colocando-se fim à descartabilidade.
De
outro lado, o implemento da garantia à estabilidade provisória levou a
humanização também do empregador, ao qual se impôs o dever de solidariedade -
mesmo que forçada - que foi atingiu, por meio da Lei importância superior ao
objetivo de obtenção de lucros do patrão que até então regera as relações de
trabalho.
Criada após a promulgação da
Carta Magna vigente, esta Lei que dispões sobre os benefícios sociais definiu
entre seus artigos 19 e 23 o acidente de trabalho e trouxe consequências
práticas muito importantes como estabilidade, afastamento, auxílios a serem
pagos pelo INSS ao empregado acidentado/doente, etc.
Muitos deles serão vistos a
seguir.
3. ACIDENTES
DE TRABALHO, DOENÇAS OCUPACIONAIS E SUAS
CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
3. 1. Conceito
Primeiramente,
é importante se entender quais fatos fazem parte do presente estudo. O conceito
de acidente de trabalho foi dado pela Lei 8.213/91 da Previdência Social, já
mencionada como grande regulamentadora dos acidentes e doenças do trabalho:
art. 19 da Lei nº 8.213/91: Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício
do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados
referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou
perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou
temporária, da capacidade para o trabalho.
A conceituação acima é de
acidente de trabalho típico, por expressa determinação legal. No entanto, o
legislador também se preocupou com as doenças profissionais e/ou ocupacionais,
que foram equiparadas a acidentes de trabalho e assim conceituadas nos incisos
do artigo 20 da Lei nº 8.213/91:
I-
doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício
do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação
elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II- doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em
função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se
relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
Como
se revela inviável listar todas as hipóteses dessas doenças, o § 2º do
mencionado artigo da Lei nº 8.213/91 estabelece que, "em caso excepcional,
constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II
deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e
com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la
acidente do trabalho".
O
art. 21 da Lei nº 8.213/91 equipara ainda a acidente de trabalho:
I - o acidente ligado ao trabalho que, embora
não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do
segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido
lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;
II - o acidente sofrido pelo segurado no
local e no horário do trabalho, em consequência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou
terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive
de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou
de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da
razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e
outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
III - a doença proveniente de contaminação
acidental do empregado no exercício de sua atividade;
IV - o acidente sofrido pelo segurado
ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização
de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer
serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa,
inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para
melhor capacitação da mão de obra, independentemente do meio de locomoção
utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o
local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção,
inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1º Nos períodos destinados a refeição
ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas,
no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do
trabalho.
De
acordo com o exposto, é possível perceber que o legislador ampliou ao máximo o
conceito de acidente de trabalho, englobando as mais diversas situações.
Isso
demonstra o interesse de proteger qualquer circunstância que enseje dano físico
ao trabalhador vinculado à pratica laborativa, mesmo que tenha ocorrido no
caminho do trabalho ou que seja causado por terceiro ou pela vítima ou motivado
pela força maior, ou que apenas tenha se intensificado com o trabalho.
Obviamente,
que cada situação no caso concreto gerará uma responsabilidade de indenizar
diferente ao empregador. No entanto, em todos os casos estará caracterizado o
acidente de trabalho e ensejará, assim, o auxílio doença acidentário, o
auxílio- acidente e todos os demais benefícios e direitos acidentários.
3. 2. Indenizações:
É
sabido que os acidentes de trabalho andam juntamente com o instituto das
indenizações, e são várias as discussões que envolvem esse tema.
Primeiramente,
há que separar os polos passivos com que o acidentado mantém relação: de um
lado está o Instituto Nacional de Seguridade Social, que tem o dever de
pensionar o trabalhador segurado quando este é acometido por algum problema
físico (acidente, doença) (Benefício Previdenciário); do outro lado,
encontra-se o empregador, que pode ser obrigado a pagar indenização a título de
reparação do dano sofrido pelo trabalhador, cuja segurança fica sob sua a
responsabilidade (Indenização Civil).
José
Luiz Dias Campos explica bem essa diferença quando diz: “a ação de acidente do
trabalho, por ser de natureza alimentar é compensatória e a responsabilidade
civil é indenizatória, visando a reestabelecer a situação existente e anterior
ao dano.”
Nesse
sentido, Sebastião Geral de Oliveira explica em sua obra que:
O benefício de natureza alimentar,
concedido pelo INSS, garante apenas um mínimo de subsistência, porém distante
de atender ao princípio milenar da retitutio
in integrum, ou mesmo de assegurar a manutenção do padrão de vida que o
acidentado desfrutava antes do evento danoso.
Há
alguns anos os empregadores que objetivavam se esquivar do dever indenizatório
alegavam que a indenização por responsabilidade civil acumulada com os
benefícios previstos na lei de seguro de acidente de trabalho representava bis in idem.
Para
grande parte da doutrina, tratam de quantias diferentes recebidas pela vítima,
assim, podem ser recebidas juntas. A sábia doutrinadora Teresinha Lorena
Pohlmann Saad explica que:
Havendo dolo ou culpa na ocorrência
infortunística, pode o acidentado, ou seus beneficiados, no caso de morte dele,
receber as duas reparações, sem compensação. São direitos autônomos fundados em
pressupostos diferentes: a prestação pecuniária acidentária coberta pelas
contribuições e paga pela Previdência Social, que responde por obrigação
própria, e a indenização civil reparadora do dano decorrente do ato ilícito.
Após
muitas discussões sobre o assunto, o Supremo Tribunal Federal colocou fim às
controvérsias por meio da Súmula 229, na qual entendeu que não há ilegalidade
no acúmulo dos dois valores, afirmando que a
indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa
grave do empregador.
Este
entendimento do Supremo Tribunal de Federal, que veio para sanar um problema
acabou gerando outra grande discussão acerca da necessidade da culpa grave do
empregador para a reparação do dano civil.
Com
isso, na Assembleia Nacional Constituinte, instalada em 1987, a questão dos
acidentes de trabalho foi bastante debatida e foi proposta a ampliação da
responsabilidade civil, para abranger qualquer acidente em que o empregador
tivesse contribuído com dolo ou culpa de qualquer grau.
A
proposta foi bem sucedida e o artigo 7º da Carta Magna de 1988 alargou
sobremaneira o campo da responsabilidade civil do empregador, pois não
qualificou o grau de culpa dele para ensejar a indenização, concluindo-se que o
dever seria imposto independente da intensidade da culpa, desde que ela
houvesse.
4. DIFICULDADE DE SE
COMPROVAR A CULPA E O FATO DANOSO
4. 1. Responsabilidade civil
do empregador
O
tema acerca das indenizações patronais é bastante polêmico, tendo em vista o
alto índice de acidentes de trabalho que ocorrem no Brasil e os altos valores
econômicos envolvidos nas ações.
Hodiernamente,
a indenização dos danos sofridos por acidente de trabalho tem como suporte
principal a responsabilidade subjetiva, ou seja, exige-se prova da culpa do
empregador para gerar o direito da vítima.
Entretanto,
tem sido muito frequente os operadores jurídicos depararem-se com uma situação
tormentosa, na qual o dano sofrido pela vítima é patente, porém a dificuldade
que esta tem de provar a culpa do empregador impede o deferimento da
indenização a que faz juz.
No caso do acidente de trabalho, tem sido
frequente o indeferimento do pedido de indenização por ausência de prova da
culpa patronal ou por ser acolhida a alegação de ato inseguro do empregado ou,
ainda, pela conclusão da culpa exclusiva da vítima.
Assim,
o grande questionamento atual é no que se refere à responsabilidade a ser
aplicada nos casos de acidentes e doenças de trabalho.
É importante mencionar que a culpa é dividida
em três formas de agir: imprudência (agir sem cuidado, causando riscos de
danos), imperícia (agir sem técnica) e negligência (omitir-se, deixar de fazer
algo importante ou necessário).
Acredita-se
que a melhor técnica usada para a constatação da culpa do empregador no
acidente ou na doença de trabalho tem sido o uso de um processo comparativo do
comportamento do empregador que acarretou o dano, com a conduta padrão esperada
de uma empresa que zela adequadamente pela segurança de seus trabalhadores, sem
executar nenhum dos verbos supra mencionados que são vinculados à culpa.
Nesse
sentido, o doutrinador e desembargador Carlos Roberto Gonçalves afirma que:
“(...) agir com culpa significa atuar o
agente em termos de, pessoalmente, merecer a censura ou reprovação do Direito.
E o agente só pode ser pessoalmente censurado, ou reprovado na sua conduta,
quando, em face das circunstâncias concretas da situação, caiba afirmar que ele
podia ou devi ter agido de outro modo.”
No
entanto, tem sido percebido um forte deslocamento do pensamento jurídico em
direção à responsabilidade objetiva, principalmente no que tange questões que
envolvem maior alcance social.
Tal
movimento é resultado da forte influência do Código de Defesa do Consumidor de
1990, que qualificou o consumidor como vulnerável, dando-lhe maior proteção e
facilidade em provar seus danos em face dos produtores, fabricantes,
comerciantes que possuem maior conhecimento dos produtos que oferecem e seus
riscos.
Da
mesma forma, muitos estudiosos defendem a vulnerabilidade do empregado face ao
empregador e defendem a aplicação da teoria objetiva.
Frente
ao avanço da responsabilidade civil objetiva no Brasil, surgiram várias
correntes com propostas de demarcação dos seus limites com a criação de
modalidades distintas dessa teoria, mas todas em torno da ideia central de
reparação do dano tão somente pela presença do risco, sem dispensável a
comprovação de culpa do réu. São as teorias do risco: proveito, criado,
profissional, excepcional e integral.
O
doutrinador Sebastião Geraldo de Oliveira as explica da seguinte forma:
Na teoria do risco proveito, aquele
que se beneficia da atividade deve responder pelos danos que seu empreendimento
acarreta; quem se aproveita do bônus deve suportar todos os ônus. A dificuldade
prática dessa teoria reside na indagação doo que seria “proveito”, com a
possibilidade de restringir a reparação apenas quando haja proveito econômico.
A modalidade mais aceita e que supera o
embaraço anterior é a do risco criado, porquanto não indaga se houve ou
não proveito para o responsável; a reparação do dano é devida pela simples
criação do risco. (...)
A teoria do risco profissional
considera que o dever de indenização decorre da atividade profissional da
vítima, sendo que seu desenvolvimento está diretamente ligado aos acidentes de
trabalho.(...)
A teoria do risco excepcional
justifica o dever de indenizar, independentemente da comprovação de culpa,
sempre que a atividade desenvolvida pelo lesado constitui-se um risco acentuado
ou excepcional pela sua natureza perigosa. São exemplos: atividades com redes
elétricas de alta tensão, exploração de energia nuclear, materiais radioativos,
etc. (...)
A teoria do risco integral é
considerada a modalidade extremada da responsabilidade objetiva, já que exige
somente o dano para acolher a indenização, mesmo que o prejuízo tenha ocorrido
por culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior.
Diante
dessas divisões da teoria objetiva é possível se observar que há uma
preocupação cada vez maior de não desamparar o lesado e de que os danos
sofridos sejam reparados. Para isso, em vez de focar na pesquisa da ilicitude
do evento danoso, tem-se preocupado mais em ressarcir o dano injusto sofrido
pela vítima, que, neste estudo, é o empregado.
Obviamente,
essas inovações serão consolidadas quando a jurisprudência firmar entendimento
sobre o tema, delineando sua aplicação prática. Enquanto não são elaboradas as
súmulas e nem há a consolidação dos precedentes dos tribunais, o melhor
indicativo dos prováveis caminhos da responsabilidade civil objetiva são as
opiniões emitidas por renomados doutrinadores nos últimos anos.
Dentre eles, pode-se destacar a escritora
Maria Helena Diniz que, sete anos atrás, já explicou o movimento, assim:
A insuficiência da culpa para cobrir
todos os prejuízos, por brigar a perquirição do elemento subjetivo na ação, e
crescente tecnização dos tempos modernos, caracterizado pela introdução de
máquinas, pela produção de bens em larga escala e pela circulação de pessoas
por meio de veículos automotores, aumentando assim os perigos à vida e à saúde
humana, levaram a uma reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro
de um processo de humanização. Este representa uma objetivação da
responsabilidade, sob a ideia de que todo risco deve ser garantido, visando à
proteção jurídica à uma pessoa, em particular aos trabalhadores e às vítimas de
acidentes, contra a insegurança material, e todo dano deve ter um responsável.
A noção de risco prescinde da prova da culpa do lesante, contentando-se com a
simples causa externa, bastando a prova de que o evento decorreu do exercício
da atividade, para que o prejuízo por ela criado seja indenizado. Baseia-se no
princípio do ubi emolumentum, ibu ius (ou
ibi onus), ou seja, a pessoa que se
aproveitar dos riscos ocasionados deverá arcar com as suas consequências.
Em que pese muitos
doutrinadores defenderam o avanço da responsabilidade civil de subjetiva para
objetiva nos casos de acidentes ou doenças de trabalho, a questão suscita
fundadas controvérsias.
Pois, de outro lado, alguns estudiosos entendem
que o caminho não é possível por ser inconstitucional, uma vez que a Carta
Magna prevê que a responsabilidade e a indenização do empregador, no caso dos
acidentes de trabalho, dependerá da intenção ou do descuido dele. Veja a
transcrição do artigo 7º:
São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XXVIII: seguros contra acidentes de trabalho, a cargo d
empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer
em dolo ou culpa;
Para
eles, uma vez que a Constituição Federal estabelece como pressuposto da
indenização a ocorrência de culpa do empregador, norma alguma de hierarquia
inferior pode contrariá-la.
Nesse
sentido, Rui Stocco assevera que, se a Constituição “estabeleceu, como princípio
inafastável, a obrigação do empregador indenizar o empregado, com base no
Direito comum, ou seja, apenas quando ele obrar com dolo ou culpa, então na se
poderá prescindi desse elemento subjetivo, com supedâneo no caput do art. 927, do CC/2002, sendo inaplicável seu
parágrafo único.”
Apesar
de esse posicionamento ter argumentos bastante consistentes, podem ser
rebatidos com a sabedoria do saudoso Arnaldo Sussekind segundo o qual “o elenco
de direitos relacionados no art. 7º é meramente exemplificativo, admitindo
complementação”.
4. 2. Ausência da
comunicação do Acidente de Trabalho (CAT)
Como
já visto, a falta de elementos probatórios que demonstrem a culpabilidade do
empregador tem sido causa do indeferimento de muitas indenizações por acidentes
de trabalho, o que tem gerado inúmeras discussões que buscam solucionar o
problema.
No
entanto, não é apenas a falta de documentos que provem a culpa do réu que
prejudicam o empregado, mas também a falta de documentos que comprovem a
própria ocorrência do fato danoso, o que impede a demonstração do nexo causal e
a reparação dos danos.
A
Legislação previdenciária traz ao empregador o dever de fazer a Comunicação de
Acidente de Trabalho (CAT), que é um documento emitido para informar um
acidente de trabalho ou uma doença ocupacional, com a finalidade de resguardar
que os direitos acidentário do empregado lhes sejam concedidos a posteriori.
A Lei nº 8.213/91 determina que a CAT deve ser
emitida pela empresa no prazo de 1 dia útil, ou, se ocorreu óbito,
imediatamente. Pode também ser emitida - mesmo fora do prazo - pelo médico,
pelo familiar, por um dependente do segurado, pelo sindicato ou por uma
autoridade pública; nesse caso o INSS enviará uma carta à empresa para que
emita sua CAT.
Art.
22. A empresa deverá comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social até
o 1º (primeiro) dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de
imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite
mínimo e o limite máximo do salário-de-contribuição, sucessivamente aumentada
nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.
(...)
§ 2º
Na falta de comunicação por parte da empresa, podem formalizá-la o próprio
acidentado, seus dependentes, a entidade sindical competente, o médico que o
assistiu ou qualquer autoridade pública, não prevalecendo nestes casos o prazo
previsto neste artigo.
A comunicação será feita ao
INSS por intermédio do formulário CAT, preenchido em 4 (quatro) vias, com a
seguinte destinação (Artigo 357 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010):
1ª via, ao INSS; 2ª via, ao segurado ou dependente; 3ª via, ao sindicato dos
trabalhadores; 4ª via, à empresa.
Uma 5ª via, poderá se fazer
necessária quando houver solicitação de Autoridade Pública. As autoridades
públicas reconhecidas para esse fim são: Magistrados em geral, Membros do
Ministério Público e dos Serviços Jurídicos da União e dos Estados. Comandantes
do Exército, Marinha, Aeronáutica, Bombeiros, Polícia Militar e Forças
Auxiliares.
Existem diferentes tipos de
CAT, que devem ser feitas conforme o caso concreto, sendo passível a alteração
pela autoridade, caso aplicada de forma errada. As comunicações resumem-se em
CAT inicial, para novas doenças ou acidentes e CAT de reabertura, para
agravamento de condição anterior.
Ocorrendo agravamento da
lesão ou doença, a empresa deverá emitir uma CAT de reabertura. Caso emita uma
CAT inicial (para negar continuidade de exposição a riscos), esta poderá ser
desqualificada pelo médico-perito, que tomará as medidas acima para o nexo
técnico. Nesse caso, a empresa fica sujeita a multa se o segurado continuou
exposto aos agentes nocivos mesmo após o acidente ou a doença.
Uma
vez que a comunicação chega ao INSS, é feito o enquadramento técnico por meio
do qual a Autarquia analisa as informações para fornecer o benefício adequado
ao empregado. Para tanto também é realizada Perícia Médica do Instituto, que
irá atestar se o acidente ou a doença ocupacional tem ou não ligação com o
trabalho desempenhado.
A
grande importância em diferenciar o tipo da doença ou do acidente é que, caso
haja ligação com a atividade laboral, são gerados os direitos acidentários, que
englobam os direitos de receber indenizações pelo dano sofrido e de
estabilidade provisória, o que não acontece nos casos de doenças ou acidentes
comuns.
Logo,
o enquadramento errado pode gerar dificuldades futuras da obtenção dos direitos
suprimidos do empregado, que já deveriam ter sido constatados desde início com
a emissão da CAT. Isso acontece com grande frequência.
São
diversos os casos em que o trabalhador procura o INSS sem nem saber que o
acidente ou a doença de que foi acometido tem relação com seu trabalho. Daí
acontece que muitos acidentes do trabalho no sentido técnico, especialmente os
de trajeto – que ocorrem no percurso realizado entre a casa e o trabalho e vice
versa – e as doenças ocupacionais são enquadrados como ocorrências comuns, por
falta de iniciativa ou de empenho para verificação do nexo causal.
O
próprio empregado, inicialmente, se acomoda com a situação quando procura o
INSS e é informado que não terá prejuízo algum com um ou outro enquadramento, já
que, desde a Lei n. 9.032/1995, o valor dos benefícios nas duas hipóteses foi
igualado pela Previdência Social.
Ao
procurar o recebimento de benefício, em virtude da necessidade do afastamento
no trabalho por qualquer que seja sua debilidade física ou mental, o
trabalhador tem como principal preocupação a obtenção do pensionamento
necessário para seu sustento e de sua família, portanto, nesse momento, não lhe
importa o enquadramento de seu acidente ou doença, desde não haja prejuízos no
valor do benefício a receber.
Assim,
por falta de instrução, o empregado, muitas vezes, não vislumbra a
possibilidade de recebimento de indenização por dano e até mesmo se esquece de
seu direito à permanência no trabalho.
E a
empresa, obviamente, não tem interesse em auxiliá-lo neste momento, pois teme
as futuras consequências patrimoniais que pode sofre. De acordo com a análise
de Sebastião Geraldo de Oliveira:
A empresa, por sua vez, nem sempre se
empenha para emitir a CAT porque o enquadramento do evento como acidente de
trabalho, além de gerar a estabilidade provisória no emprego após a alta,
quando o afastamento for superior a 15 dias, acarreta a obrigação de depositar
o FGTS no período de afastamento. Ademais, a indenização por sua
responsabilidade civil prevista no art. 7º, XXVIII, da Constituição da
República, exige a prévia caracterização da ocorrência como acidente de
trabalho, sendo este, provavelmente, o fato mais preocupante para o empregador.
É fácil concluir, portanto, que além da subnotificação explícita, há uma outra
mascarada, mais sutil, que reduz as estatísticas dos acidentes do trabalho, mas
sobrecarrega o desembolso dos benefícios previdenciários.
Ao final de sua ponderação,
o jurista traz outro fator muito importante: o aumento dos custos da
Previdência Social. Acontece que, quando o benefício concedido tem ligação com
o trabalho, o valor gasto com ele é depois reavido pelo INSS do empregador, que
lhe faz o reembolso, e, por outro lado, quando o benefício é comum o
ressarcimento não acontece.
Para evitar as omissões dos
empregadores foi que a Lei já previu a possibilidade de a CAT ser formalizá-la
pelo próprio acidentado, por seus dependentes, pela entidade sindical
competente, pelo médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública, conforme
dispõe o artigo 22, parágrafo 2º da Lei nº 8.213/91, já transcrito
anteriormente.
Ademais, mesmo sem a CAT
empresarial, o perito médico do INSS pode reconhecer o nexo técnico, ou seja,
que a lesão ou doença foi causada no ambiente de trabalho. Para tanto, pode
solicitar outros documentos (atestado de saúde ocupacional, perfil
profissiográfico previdenciário etc.) ou vistoriar o posto de trabalho na
empresa.
Cabe ressaltar que o
segurado especial, assim definido pela Lei da Previdência Social - pequeno
agricultor e pescador - não é empregado, logo não pode apresentar CAT
empresarial e o trabalhador avulso apresenta CAT emitida pela empresa tomadora
de serviço. Os outros segurados não possuem direito a benefícios acidentários.
Pode-se concluir então que a
CAT tem duas funções precípuas: o correto enquadramento do acidente ou doença
para a concessão do benefício previdenciário adequado e, a formalização da
ocorrência do fato danoso, que importante função probatória para que a vítima
possa alcançar os direitos acidentários que lhes são legalmente garantidos.
Acerca do enquadramento do
infortúnio - o segurado que tem interesse de que este seja de acidente de
trabalho, na expectativa de que esse gere efeitos em outras áreas - poderá
interpor recurso administrativo caso não concorde com ele.
Caso não consiga a
alteração, poderá ingressar com ação perante o Poder Judiciário perante a
Justiça Comum Estadual. Desde 1967 o Supremo Tribunal Federal havia firmado
entendimento no sentido de que era imprescindível se esgotar os recursos na via
administrativa para, somente depois, dar entrada na Justiça.
No entanto, em decorrência
de diversas mudanças legislativas, instalaram-se frequentes discussões
doutrinárias e jurisprudências que perderam intensidade com a nova Constituição
Federal de 1988, que previu que: lei alguma pode excluir da apreciação do Poder
Judiciário qualquer lesão ou ameaça de direito.
A matéria foi pacificada
pelo STJ com a Súmula 89, que diz: A ação acidentária prescinde do exaurimento
da via administrativa, sendo que o próprio STF já deixou de aplicar a Súmula n.
552. Assim, as ações contra o enquadramento
podem ser ajuizadas na via judicial em face do INSS.
Conforme já explicitado, muitas
empresas deixam de emitir a CAT e o empregado desinformado também não o faz.
Percebendo isso, o Tribunal Superior do Trabalho passou a admitir e dar
procedências aos recursos que buscavam o reconhecimento do acidente do trabalho
e seus consequentes direitos, mesmo quando não tivesse sido feita a CAT.
O TST percebeu que o apego à
formalidade poderia causar sérios prejuízos à vítima, e assim, para constatar a
ocorrência do acidente de trabalho passou a verificar as provas nos autos, que
o comprovasse. Ementas atuais desse Tribunal mostram como ele tem se
posicionado. Veja uma delas:
“Recurso
de revista. Estabilidade provisória. Acidente de trabalho. Vigilante de escolta
armada. Acidente automobilístico em rodovia interestadual. Não emissão de CAT
pelo empregador. Garantia de emprego. Incontroverso que o autor sofreu acidente
de trabalho, consubstanciado em acidente automobilístico em rodovia
interestadual, quando do exercício da função de vigilante em escolta armada, e
que, não tendo sida emitida a CAT pelo empregador, o empregado retornou ao
trabalho apenas 3 dias após o infortúnio. Sendo dever legal do empregador
comunicar ao órgão previdenciário, por meio da respectiva CAT, a ocorrência de
acidente de trabalho, a dispensa de empregado que sofreu acidente de trabalho,
após 4 meses do retorno do afastamento, denota o desrespeito à garantia da
estabilidade provisória no emprego. Não se pode convalidar conduta de empresa
que deixa de proceder à emissão da CAT, nos termos do art. 22 da Lei n.
8.213/91. Não há como chancelar a conduta de empresa que não emite o documento
obrigatório a amparar a proteção do empregado acidentado em relação a despedida
arbitrária, nos termos do art. 7º, I e XXI, da Carta Magna. Recurso de revista
conhecido e provido.” TST. 6ª Turma. RR – 124801-44.2009.5.17.0011, Rel.
Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 27 set. 2013.
Neste capítulo é possível se
vislumbrar os empecilhos que sofrem os empregados em demonstrar o acidente de
trabalho e receberem a indenização reparatória adequada à diminuição de seus
danos.
Diante disso, doutrinadores
e julgadores esboçam sugestões para que se diminuam as impunidades, levando os
empregadores a terem maior zelo com a mão de obra que executa sua atividade
financeira. Acredita-se que esse é o caminho mais provável para a diminuição do
problema.
5. CONCLUSÃO
Desde
o início dos tempos, o homem trabalha. O trabalho surgiu para o homem prover
sua sobrevivência, pois se quisesse comer tinha que ir atrás da caça, se
quisesse se aquecer tinha que produzir fogo, etc. Enfim, o homem não tinha quem
fizesse algo para ele.
Com
o passar dos anos, surgiram novas configurações sociais e o homem passou a
experimentar o comodismo de que outros lhe servissem. Isso culminou num grande
problema com o advento da possibilidade de enriquecimento por meio da mão de
obra, que deu ensejo ao tratamento predatório do homem sobre o próprio homem.
Porque com advento da produção em massa e a
possibilidade de se acumular lucros, a burguesia passou a submeter o
proletariado a condições desumanas como: salários baixíssimos, jornadas
excessivas de trabalho e péssimas condições locais.
E
dentre os vários abusos, estava o descaso com a integridade física, moral e
psicológica dos trabalhadores, os quais acabavam sofrendo danos irreversíveis
como doenças, mutilações, queimaduras e até mortes. Isso desencadeou fortes
pressões sociais, que forçaram o Estado à elaboração de normas trabalhistas
protetivas.
Entretanto,
apesar das diversas normas inseridas no ordenamento jurídico brasileiro, a
ocorrência de acidentes e doenças ocupacionais ainda hoje é grande, o que tem
demonstrado altos índices e, portanto, a ineficácia das Leis.
Os
empregados encontram grandes dificuldades em provar os acidentes ou doenças do
trabalho, bem como os empregadores não comunicam as autoridades responsáveis
acerca de infortúnios ocorridos, o que mascara os reais índices de acidentes
que ocorrem no Brasil.
O
presente trabalho dá ênfase nos pontos que dificultam a aplicação das normas
acidentárias protetivas e esboça sugestões doutrinárias e medidas que têm sido
aplicadas por julgadores. Tais propostas primam pela reparação dos danos
sofridos pela vítima, acima de qualquer fator.
Com
isso, muitos acreditam na responsabilidade civil objetiva do empregador como
solução dos problemas ligados à indenização.
Mas,
para outros, a figura da culpa para a imputação da responsabilidade patronal é
essencial, já que foi assim prevista pela Constituição Federal.
Assim,
apesar de conhecida a necessidade de alterações legislativas que protejam os
trabalhadores, há várias críticas acerca de injustiças que podem acometer os
empregadores ou mesmo o desrespeito à Carta Magna, o que torna o tema polêmico.
Os
pontos abordados demonstram resumidamente diversas análises e hipóteses ligadas
ao tema, que ainda será passível de muitas discussões.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS